terça-feira, outubro 09, 2007

Amadeu.

"Vai até o quarto e a bolsa está em cima da cama. Abre o zíper e é mesmo assustador vislumbrar aquilo tudo, porque indica que sua vida vai mudar e por que não experimentar um pouco dessa sensação no seu estado bruto. Amadeu perfura um dos pacotes, pesando quase meio quilo cada um, e com a ponta de uma colher retira um punhadinho. Lacra novamente o pacote com a ponta da fita adesiva e deposita sobre a mesa do quarto o punhadinho branco, aquela pequena montanha mágica, e pela primeira vez ele desceria por ela, esquiaria por suas depressões, esquivaria-se de suas falhas. Com o cabo da colher, a montanha transforma-se em trilhas paralelas e consegue construir três fileiras curtas. São trilhas breves, limitadas como a vida para algumas pessoas. Pensa por onde começar. Qual dos caminhos ele deve escolher. Tapa a narina direita e arrasta como um porco o focinho sobre a mesa. Absorve o estado bruto da liberdade, da mudança e apaga da mesa os três caminhos que criou. A primeira coisa que pensa é que não há mais caminhos ou rastros, ele os absorveu e torna-se o próprio, o dono de suas trilhas.
Aquilo é nocivo e doce feito mel apodrecido. Está com fome e devoraria qualquer substância orgânica nessa hora. Não almoçou e não lembra-se de ter comido nada durante todo o dia. Talvez agora tivesse um almoço. Nu."

[trecho do romance A GUERRA DOS BASTARDOS _ ana paula maia]

*That´s all folks*

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