quinta-feira, abril 06, 2006

Como me tornei fatalista

Há dias em que tudo está igual ao dia anterior, ou ao dia anterior de dois anos atrás. Sinto na boca do estômago esses dias, é uma sensação fria. Meus sentidos aguçam. Ouço o tique-taque do meu reloginho de cabeceira a metros de distância. Tenho um tipo de sensibilidade que me faz tomar choque onde ninguém toma, as luzes tendem a queimar quando eu as acendo. E principalmente, se houver algum aparelho ligado no som mínimo, posso sentir a estática no ar. Não apenas sinto, como a escuto também. Às vezes é estranho conviver comigo. Aprendi desde cedo a medir minhas palavras para não me acharem diferente. São muitas histórias que não posso contar. Afetaria tudo ao meu redor. Aprendi cedo, aos sete anos. Me tornei fatalista aos sete anos. Não tenho prazer nisso. E fui assombrada desde sempre. Por quem? Pelo quê? Não sei dizer. Aos sete anos, eu sabia das coisas. Simplesmente, não havia mistério para mim. Entendia a conversa dos adultos. Minha mãe tomava muito cuidado quando eu estava por perto, mas não adiantava.
Gostava do escuro e andava pela casa sem acender a luz. Gostava de me sentar dentro do armário de roupas da minha mãe, porque além de escuro era confortável. Gosto do escuro desde pequena também.

Já previ em sonhos ou acordada mais de vinte mortes. Perdi a conta. Alguns acidentes também. Até mesmo comigo e soube o que fazer na hora. É sério. A primeira vez, não me lembro. Mas ainda criança vi a morte de um pedreiro que trabalhava na minha casa. Ele me conhecia desde sempre e gostava de ajudá-lo na obra. Carregava um pincel, lhe trazia um copo d´água. Sonhei detalhadamente com sua morte semanas antes de acontecer, e até hoje me lembro muito bem. Ele se matou ao se atirar na linha do trem, pois descobriu que estava com câncer. Eu era muito nova para entender isso, mas eu já conhecia a morte em sonhos.

Minha mãe evitava falar sobre o assunto, me calei desde então. Até hoje não fico tagarelando sobre isso, nem sei porque falo disto aqui. É reservado demais. Acho que falo, pois tenho um teclado e um monitor, isso me protege de alguma maneira, sei lá, ou talvez eu queira falar.

Quando tinha uns 13 anos, a coisa piorou. Parecia um período de transição magnética, espiritual, sei lá. Eu pirei. Várias pessoas morreram e eu vi a morte de todos. Não eram muito próximos, vizinhos, mas é que houve assassinato na coisa. Assassinato é a pior das mortes, porque é mais intensa que as outras. Parece uma explosão, é brusco demais. Por isso ficava cansada o dia todo. Sentir a morte tira o fôlego. Também já vi mortes naturais, tipo: “chegou a hora” e essas são brandas. Mas todas são estranhas, em todos esses anos não me acostumo.

Não tenho fascinação pela morte, mas desde cedo tenho uma relação direta com a dita-cuja. Sou uma pessoa do bem. Não gosto de cultuar nada trash, a não ser alguns filminhos podres da década de oitenta e olhe lá. Não estimulo cultuar nada disso, pois já sou afetada por demais.

Sofri de paralisia no sono até meus doze anos mais ou menos. É uma coisa rara, funciona assim: Você acorda. Abre os olhos. Respira. E só. Não consegue se mover ou falar. E é preciso se concentrar numa coisa veloz, brusca. Eu pensava em montanhas-russas. Sempre. E conseguia me mexer. Bastava mover o dedo mindinho, para todo o corpo voltar a se movimentar.

São histórias pesadas, de tirar o sono. Não dá pra contar mesmo, vai parecer mentira, se esse pouco aqui não parecer. Nunca tive medo de nada, a não ser, Papai Noel e Girassóis. Vai entender! Mas aí é história para um outro post.

Bem, é daí que nasceu minha fascinação por filmes de terror. Eu tentava aprender alguma coisa com eles. Me ensinaram muito pouco. Minha mãe achava que eu poderia ter algum problema, sei lá qual, mas devido a quantidade absurda de filmes que assistia por mês ainda criança. Vinte filmes em média. Devorei todo o catálogo da locadora e não encontrava respostas. Achei melhor fazer perguntas. Então até hoje faço perguntas de todo o tipo.
Ainda bem que ninguém teve a idéia mirabolante de me explorar em programas de auditório. Nunca entortei colheres ou levitei. Escapei. É isso que gostam de assistir. Ou eu virava esotérica ou escritora. Ou escritora esotérica. Escreveria auto-ajuda. Me entenderia com as estrelas. Palestraria com os astros.

Sou sociável. Fui criança-cão, daquele tipo que todo mundo quer colocar de castigo. Tomei muito beliscão. Levei surra. Castigos diversos. Minha mãe diz que nunca viu criança igual e ela sempre foi professora. Conheceu sempre muitas crianças. Em festinhas de aniversário, eu organizava os piques. Pique-Tá, Pique-Pega, Pique-Alto, Pique-Cor e é claro, Pique-Esconde. Garotinha muito sociável.
Minha mãe dizia que eu não parecia uma menina. Era muito levada. É claro, era minha válvula de escape, ora bolas. Vá conspucar-se com o espírito dos outros. Vá lá! Você precisará se esforçar muito mais para conservar sua sanidade.

E por falar em fatalismos pessoais, lendo notícias atuais sobre a realidade factual, hum, descobri o futuro do mundo de Leonard Cohen.

...

“Give me back the Berlin wall
Give me Stalin and St Paul
Give me Christ or give me Hiroshima

Destroy another fetus now
We don't like children anyhow
I've seen the future, baby: it is murder”
[música The Future _ Leonard Cohen]

***
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*That´s all folks*

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